sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Cameron & Johnson: baderneiros gratuitos

Quando David Cameron e Boris Johnson quebravam vitrinas
por Marco D'Eramo

O primeiro-ministro é descendente ilegítimo do rei William IV e sua amante Dorothea. O primeiro-ministro conservador, que agora troveja contra os vândalos, há 24 anos, foi salvo da prisão pela carteira do papai.

Numa cidade inglesa uma gang de jovens quebra uma vitrina, foge na noite e corre para o jardim botânico. A polícia os persegue, apanha alguns com seus celulares e os põe na prisão.
O problema é que não estamos falando de um episódio ocorrido nestes dias. E os jovens detidos não são desordeiros sub-proletários. Não, o episódio aconteceu há 24 anos em Oxford e os 10 jovens eram todos membros do Bullington Club, uma associação estudantil oxfordiana com 150 anos de idade, famosa pelas suas travessuras estudantis, suas bebedeiras e por considerar a vandalização de lojas e restaurantes como a melhor das distrações. Os problemas com donos de restaurantes, comerciantes e de denúncias à polícia são resolvidos com algumas lautas indenizações vindas das gordas carteiras paternais. Algumas horas antes, os dez bravos jovens fizeram-se retratar nos degraus de uma grande escada, todos com uniforme do clube, roupa de gala a 1000 libras esterlinas (1150 euros, R$2.620,00) cada uma. Dentre eles destaca-se um jovem David Cameron e um igualmente imberbe Boris Johnson.
Acontece que hoje Cameron é o primeiro-ministro conservador da Inglaterra e Johnson é o prefeito conservador da Grande Londres. E ambos trovejam contra os vândalos que destroem as propriedades privadas. Ambos defendem a linha dura, a mão de ferro. Cameron quer recorrer ao exército e censurar as redes sociais; Johnson quer aumentar os efetivos da polícia. Nem mesmo um mínimo de compreensão por quem não faz outra coisa, no fundo, senão emular os seus gestos de outrora.
Mas, evidentemente, é característico da mentalidade de um filho de papai considerar que os outros não podem – e não devem – permitir-se aquilo que lhes foi permitido, a eles, por direito de nascimento e de extrato social.
David Cameron nasceu em 1966, filho de um pai agente da bolsa e de uma mãe filha de um baronete: o atual primeiro-ministro gosta de divulgar que é o descendente ilegítimo do rei William IV e da sua amante Dorotéia, e portanto que é um parente longínquo da rainha Elisabeth II. Snob típico, Cameron foi enviado aos sete anos para Heatherdown, escola preparatória frequentada também pelos príncipes Andrew e Edward, escola cuja atitude de classe era sem equívocos: nos dias de excursão, as toilettes portáveis eram designadas de "Ladies", "Gentlemen" e "Chauffeurs". E quando Margaret Thatcher foi eleita primeira-ministra, a escola comemorou com uma partida de cricket improvisada de alunos contra professores. Para os estudos ginasiais Cameron foi enviado à mais prestigiosa escola privada da Inglaterra, Eton (a taxa anual é de 27 mil libras esterlinas, cerca de 31 mil euros, R$71.000,00), a forja da classe dominante (Boris Johnson também foi seu colega de classe em Eton): é curioso que na Grã-Bretanha as escolas privadas sejam chamadas de escolas públicas (public schools). Ali o jovem Cameron foi pego tentando colar e, como punição, teve de copiar 500 linhas de latim. Depois de Eton, naturalmente, a universidade foi Oxford e seu clube foi Bullington.
Como perfeito snob, Cameron casou-se depois com Samantha Gwendoline Sheffield, cujo pai é um baronete proprietário de terras e cujo padrinho é visconde. Samantha Gwendolina trabalha na célebre casa de produtos de luxo Smytson, de Bond Street, e foi premiada como a Melhor Designer de Acessórios pelo British Glamour Magazine.
Quando se recuperam das suas asneiras estudantis, os filhos de papai geralmente fazem uma bela carreira: Boris Johnson tornou-se diretor do Spectator (ainda que a sua carreira cambaleie com as suas aventuras de mulherengo inveterado, apesar de casado). Cameron tornou-se diretor de Assuntos Corporativos na Carlton Communication, uma sociedade de mídia absorvida a seguir pela Granada plc para constituir a ITV plc.
Em 2005, quando Cameron vence o congresso Tory e torna-se líder do partido conservador, tem apenas 38 anos. E naturalmente, no governo sombra que forma (o primeiro-ministro na época era Tony Blair), três dos membros são antigos alunos de Eton (Old Etonians). Mas no grupo restrito dos seus colaboradores mais próximos, pelo menos 15 são Old Etonians. E passa-se o mesmo quando, em Maio de 2010, Cameron ganha (pela metade) as eleições e torna-se primeiro-ministro à testa de uma coligação com os liberal-democratas dirigidos por Nick Clegg: também aqui o núcleo duro do governo é constituído por aristocratas, etonianos ou oxfordianos, como o atual o ministro da Economia George Gideon Osborne, também ele nobre, herdeiro do baronato Osborne, também ele diplomado em Oxford, e também ele, é claro, antigo membro do Club Bullington.
Como se dizia outrora: o bom sangue não mente. Tampouco a classe (social).
(1) Sebastian Grigg, (2) David Cameron, (3) Ralph Perry-Robinson,
(4) Ewen Fergusson, (5) Matthew Benson, (6) Sebastian James,
(7) Jonathan Ford, (8) Boris Johnson e (9) Harry Eastwood



O original encontra-se em  http://www.ilmanifesto.it/area-abbonati/in-edicola/manip2n1/20110812/manip2pg/07/manip2pz/308246/


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